terça-feira, 31 de janeiro de 2012

"Era dessas que não olhava pra trás. Dessas que olham com os olhos cheios de lágrimas mas não choram. Daquelas que nunca desmoronam na frente dos outros, sabe? 'Madamezinha de ferro' eu dizia e ela sorria um riso de vencedor. Acho que não sinto falta dela não, cara. Eu conheci a senhorita estérica que havia dentro dela, ela reclamava tanto, tanto, tanto. Era meio louca, adoravelmente louca, mas ainda assim, louca. Falava enquanto dormia - e falava pelos cotovelos - e era daquelas que gesticulam com as mãos, com a face, com a intonação da voz. Sempre muito espertinha, e sempre muito teimosa. Dava trabalho aquela menininha mequetrefe. Gostava muito de incensos, luz de velas, comer de madrugada, fazer amor fora de hora. Gostava mais ainda de me irritar, cutucar, cantarolar, ronronar e principalmente ir se enfiando nos espaços que haviam entre meu corpo e a cama, ela se espalhava ao meu redor e dormia toda colada e unida, com a cabeça no meu peito. Ela acordava com um humor pra lá de ácido. E se irritava fácil, fácil. Dizia que não se importava, mas era muito ciumenta. Sabe, acho que sinto um pouco de falta desses defeitos, desses que ninguém viu, que ninguém sabe. Desses que ela me mostrou sem querer ou que me deixou ir descobrindo aos poucos. Sabe, ela tinha um coração enorme que eu podia tocar quando quisesse, mas eu olhava de um angulo errado, sabe? Ela era carinhosa e divertida. E hoje ela voltou a ser a madamezinha de ferro, talvez ainda mais linha dura comigo. Ela passa diante de mim e me olha séria, com os olhos vazios sabe. As vezes, ela finge que não viu, e abaixa a cabeça, sorri pro outro lado e finge que está conversando. Sinto falta dela. Talvez eu pudesse contar, sabe? Mas não adiantaria. Eu fiz ela se despir de todas as armaduras e eu a feri no fim. Mesmo que ela me perdoe, ela nunca mais vai se jogar com toda aquela confiança, entende? A ultima coisa que ela me disse era que eu era um fraco, e não disse mais nada. Virou-se e se foi sem olhar pra trás. Aprendi que mulheres não são tão complicadas, enfim. E que tudo que elas querem é apenas serem amadas com todos os defeitos, que no fim se tornam características marcantes - o que nos faz amá-las ainda mais. Olha, lá vai ela. Ouvi dizer que ela ainda sente, ouvi dizer que jurou nunca mais se mostrar assim pra ninguém. Aprendi que ela não é uma mulher pra fracotes. Ela é bem mais."

Nenhum comentário:

Postar um comentário