segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Foi menina que amou as estrelas,
Foi moça que amou os poemas,
Foi mulher que amou marido e filhos.
E no jeito torto de amar tanto estas coisas,
Fez de tudo arte,
Fez do amor caminho.

Marianna Correia

O silêncio dominava a sala e a vida dela. Ali, na mesma sala mas muito distantes. Ele jantando enquanto ela lia, sem trocar de página. Não posso dizer com exatidão o que se passava na mente dela. Acho que um misto de uma saudade do que nunca aconteceu mas que ela queria muito que tivesse acontecido e de uma raiva por tanta indiferença. Nada havia acontecido senão o tempo. Que cada dia construía um muro de diferenças entre os dois. As lembranças de um tempo feliz latejavam na cabeça dela. Talvez na dele também, mas não há como saber. Daquele tempo nada havia restado. Tentou puxar um assunto mas depois da interrogação o silêncio voltou a reinar. Nada lhe doía mais do que quando ele fingia que não a tinha ouvido. De repente seus olhos ficaram vazios e ela voltou a encarar o livro. Os olhos ardiam secos mas não havia nenhuma lágrima neles. Não chorava duas vezes pela mesma coisa. E, por aquele motivo já havia chorado muito, mas sempre depois que ele saía apressado. Ele terminou e se levantou, saindo sem se despedir, ela cortou o silêncio:
- Pai?
- Não é uma boa hora. - Enquanto fechava a porta.
Talvez nunca fosse.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012


Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar.

 Chico Buarque

terça-feira, 20 de novembro de 2012


Eu soube que ele era o certo quando nós ficamos em silêncio deitados depois da primeira vez que fizemos sexo. Não fazia muito tempo que nós tínhamos nos beijado pela primeira vez e nós nem namorávamos. Eu podia ver metade do rosto dele e os olhos na altura dos meus. Eu estava tímida mas ele parecia estar tanto quanto eu, o que achei incomum para um garoto da idade dele. Não foi um sexo comum de duas pessoas que apenas tem vontade de fazer, sabe? Foi mais que aquilo. Nós ali em silêncio e ele não dizia nada. Minha boca pinicava pra dizer 'eu te amo' mas realmente era muito, muito cedo. O que não fazia com que a minha boca pinicasse menos e então reformulei a frase e tudo que saiu foi um "você é.. lindo". Uma semana depois em uma situação não menos íntima ele me pediu em namoro (ou foi levado a isso). Mais um namoro. Realmente eu ficaria falada. Era o terceiro namoro em um período de seis meses. Danem-se. Era um namoro e eu estava feliz.   Duas semanas depois ele me disse que me amava e eu finalmente disse à ele que o amava também. Depois de dizer isso de "eu te amo" fiquei meio atordoada. Não era a primeira vez que alguém me dizia que me amava e eu dizia de volta mas dessa vez era diferente. Na verdade eu queria desesperadamente que desta vez fosse diferente. Da última vez que um cara tinha dito eu te amo pra mim, era só o começo de uma sucessão de mentiras. Um dia, daqueles em que substâncias conectam sua mente com a sua boca sem que antes você possa raciocinar, eu parei diante dele muito séria e repetia "Cara, eu te amo mesmo. De verdade" não em um tom de alguém que quer convencer alguém mas em um tom que alguém está surpreso e assustado de algo que soube de si mesmo. Era real. Então eu o amava. E percebi isso assim que a ideia de perdê-lo me apavorava. Eu nunca tinha tido ciúmes de ninguém, eu nunca tinha chorado na frente de alguém e as coisas que nós dizíamos um ao outro não são segredos que se divide com qualquer pessoa, talvez do tipo que não se divide com ninguém mas nós dividíamos como se fossemos a mesma pessoa, como se nós fossemos um extensão do outro. E era assim que nós nos sentíamos. Eu tinha mais certeza de que seria ele pra sempre a cada dia que eu acordava enquanto ele ainda dormia. Se os anjos dormissem, teriam aquela aparência. Eu sabia que era ele porque mesmo irritado ele ainda era sensível. Mesmo sendo odiável ele ainda me fazia amá-lo mais ainda. Eu soube que ele era o cara certo quando ele saía pra pegar alguma coisa no cômodo ao lado e me dava uma saudade absurda e dos planos que fazíamos juntos. Eu sabia que era amor quando ele dizia alguma coisa que me fazia querer socar a cara dele e mesmo assim eu não conseguia ficar brava. Eu sabia que ele era ele todas as vezes que ele me lembrava meu pai. E inventávamos dezenas de apelidos bobos e desenhávamos um ao outro. Eu sabia que ele era o cara certo porque eu sabia que eu era a garota certa pra ele. Quando for o cara certo não vai deixar a impressão de que os outros eram errados, vai deixar a impressão de que os outros nunca existiram. Quando for o cara certo, meu bem, você vai saber.

Para minhas futuras filhas e netas.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012


Que a vida é linda como você 
Eu que era louco 
Eu que era triste 
Deixei de ser 
Até parece 
Que só existe eu e você.

Vinícius de Moraes

quarta-feira, 14 de novembro de 2012


Nunca me recupero totalmente das coisas que eu perdi. Dos amigos de anos que já não conheço mais, de mim que não sou mais a mesma e da vida que vai nos tirando as coisas. Tudo acaba uma hora. A eternidade é utópica e acredite, eu queria acreditar nela também. Queria acreditar em um punhado de coisas que não acredito. Queria acreditar em um Deus que nos cuidasse e amasse e queria, assim como muitos, deixar suas crueldades invisíveis aos meus olhos. Queria acreditar que quando morremos nós acordamos em outro lugar e hora ou outra todos nós acabamos nos esbarrando lá, mas não acredito nisso. Queria acreditar que qualquer fim pode ser um recomeço de outra coisa, mas não acredito. De qualquer forma, todo dia que acaba é um fim. Pessoas morrem, relacionamentos acabam e a gente, inevitavelmente, morre um pouquinho.

domingo, 4 de novembro de 2012

A Terra gira tão rápido em torno de si e rodopia em torno do Sol enquanto a gente nem sente. A gente vive na vertical e nem percebe. Talvez seja esse o motivo das minhas vertigens: perceber e sentir demais.
Jeová, Javé
Buda, Maomé,
Thor, Jesus, Alá,
Afrodite, Iemanjá,
Huracán, Zeus, Bital,
Mama Cocha, Rei Pelé,
Eros, Ades, Nike, Orfeu,
Dentre eles qual é o seu?
Pacha Mama, Tom Jobim,
Quem é que há por mim?
Aúra Mastra, Arimã, 
Xandoré, Xamã
Caapora, Aruanã,
Exu, Oxossi, Obaluauê,
Quem existe pra você?
O Alcorão,
A Bíblia,
O Bagavadguitá,
A Cabala,
O Zend Avesta,
E só existe o seu…
Todos nós somos ateus,
Com qualquer outro Deus.
Eu acredito em apenas um Deus
A menos que você!

Marcos Biesek

sábado, 3 de novembro de 2012

500 dias com ela e 127 dias com ele

Na cena do filme, um micro-documentário sobre o amor. Ele pausou o filme me perguntando se eu havia entendido. Não, não entendi. Pelo menos não aquela hora. Criei teses e minhas hipóteses pareciam não serem ouvidas por ele. Não, eu não tinha entendido. Talvez ele não tivesse dito nada porque não a amava? Não, olha o estado emocional que o cara tinha ficado quando ela tinha o abandonado. É, ele amava ela sim. E ainda assim não soube o que dizer. Acabou o filme e olhe, já que estou falando sobre ele já lhes aconselho que não gastem dinheiro alugando-o. É a comédia mais triste que já vi. E, no final ele recomeça a contagem  com uma outra moça. Ela casa com outro cara. Pronto, contei o final no filme. Um cara que se apega numa garota que não quer nada sério e o cara topa na hora mas depois acaba se apaixonando. Atenção, tô falando da droga do filme. Parece que conhecemos essa história né? Já aconteceu comigo e já deve ter acontecido com você ou com alguém que você conhece. Fim do filme. Eu falando asneiras como sempre e ele tentando arrancar minhas verdades. E eu digo, sem mistério nenhum meus medos e ele fica ali, pasmo com a minha capacidade de ser uma criança tão inocente no corpo da mulher que ele conheceu. Ele, por fim, me convence de que é uma bobagem temer e que me ama de verdade. Me acho um bocado clichê e óbvia e ele  ainda ali, sorrindo e mexendo nos meus cabelos. Não é mentira. Ele me ama também. Ele me ama mesmo. Ele não sabe mentir e mesmo que soubesse, nem o melhor dos mentirosos mentiria tão bem. O coração espalhado e batendo no meu corpo todo, eu queria dizer o que eu sentia naquele momento mas não saiu. E nem sairia se eu tivesse um teclado pra digitar ou uma caneta pra escrever. Não sabia o que dizer, talvez as palavras certas não haviam sido inventadas ainda. Ele era meu e eu era tão dele que era até um pouco dele, de certa forma. Entendi o que a moça dos olhos azuis diz no fim do filme sobre "ter certeza". Eu tive. E, depois, me lembrei de mim dizendo assim como ela de que 'não saberia pertencer'.. Talvez só seja necessário ter certeza e ali eu tive. Nunca mais haveria uma contagem nova. Eram os 127 de uma contagem que só acabaria se a vida acabasse, talvez nem assim..